Após dois anos e sete meses buscando documentos, ouvindo depoimentos e
visitando locais de torturas e mortes, os membros da Comissão da Verdade
apresentarão nesta quarta-feira (10) o relatório final sobre as violações aos
direitos humanos cometidos entre 1946 e 1988, especialmente na ditadura
militar, de 1964 a 1985. A divulgação ocorre quando se celebra o Dia
Internacional dos Direitos Humanos.
O documento lista os responsáveis pela repressão política, além de 434
vítimas dos crimes cometidos. Há ainda a relação dos locais onde ocorriam as
sessões de interrogatórios forçados, prisões ilegais e desaparecimentos
forçados. A íntegra dos três volumes, com mais de 2 mil páginas, será disponibilizada
às 11h no site oficial da comissão.
Antes, os seis integrantes do grupo – os advogados José Carlos Dias, José
Paulo Cavalcanti Filho, Rosa Cardoso e Pedro Dallari; a psicanalista Maria Rita
Kehl e o cientista político Paulo Sérgio Pinheiro – farão uma reunião com
a presidente Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto, para entregar o relatório.
Presa e torturada durante o regime militar, Dilma sancionou em 2011 a lei
que criou a comissão, proposta pelo antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva,
aprovada pelo Congresso, e fruto de três conferências de Direitos Humanos,
promovidas desde o governo Fernando Henrique Cardoso.
Para o evento no Planalto, foi permitida a presença
de 50 convidados pela comissão, entre familiares de vítimas e colaborares
do relatório.
Depois, às 11h, os membros da comissão farão a apresentação pública do
documento na sede da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em Brasília. Devem
participar da solenidade vítimas da repressão, familiares de mortos e
desaparecidos, comissões da verdade estaduais, municipais e institucionais,
comitês de memória, verdade e Justiça, além de outros órgãos representativos da
sociedade civil. Uma centena de entidades foram convidadas.
Presidente da OAB, Marcus Vinícius Furtado Côelho diz que a apresentação do
relatório serve não só ao resgate da memória, mas tem função pedagógica.
“É momento de refletir sobre o passado e unir esforços pela permanência da
democracia. Nos deixa preocupados, por exemplo, o índice dos jovens do Sudeste
que não apoiam a democracia porque não vivenciaram os horrores da ditadura”.
À tarde, os integrantes da Comissão da Verdade entregarão o relatório para o
presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, e os presidentes
do Senado e da Câmara - Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves.
Relatório
O relatório é composto de três volumes e dividido em 18 capítulos. O primeiro
descreve os fatos principais da ditadura, desde o contexto histórico que
antecedeu o golpe militar de 1964, passa pela criação dos órgãos de repressão,
as ações de repressão no exterior (como a Operação Condor, de colaboração com
ditaduras latino-americanas), além dos métodos usados na repressão aos
opositores do regime.
Há ainda um capítulo sobre a atuação do Judiciário, outro sobre a guerrilha
do Araguaia (iniciativa de luta armada a partir do campo no Norte do país),
além da relação de locais onde ocorreram as violações e a lista de responsáveis
indiretos e diretos pela implantação, manutenção e prática sistemática de
torturas, homicídios e prisões ilegais. Uma última parte contém as conclusões e
recomendações.
O segundo volume traz estudos elaborados por equipes coordenadas pelos membros
da comissão sobre diversos grupos que sofreram ou colaboraram com a repressão.
Há, por exemplo, capítulo dedicados aos militares perseguidos ou a empresários
que ajudaram na perseguição. Há também textos referentes à perseguição contra
operários, camponeses, universitários, religiosos, homossexuais, além de um
sobre os grupos armados de oposição.
O terceiro e último volume conta a história de cada um dos 434 mortos e
desaparecidos identificados pelo grupo, bem como as circunstâncias que os
levaram à morte. Os relatos mostram o sofrimento por que passaram e fazem
reverência à oposição que fizeram ao regime de exceção.
Pesquisa
Com o objetivo de “efetivar o direito à memória e à verdade histórica e
promover a reconciliação nacional”, a comissão se debruçou sobre mais de 20
milhões de páginas de documentos sobre a ditadura guardadas no Arquivo
Nacional.
Também realizou cerca de 80 audiências públicas, para tomar depoimentos ou
trocar informações no Distrito Federal e em 14 estados (ES, GO, MA, MS, MG, PA,
PB, PR, PE, RJ, RS, SP, SC e TO).
Em sessões públicas ou reservadas, foram ouvidas mais de 1.120 pessoas, seja
para dar testemunhos voluntários sobre as violações ou depoimentos
obrigatórios, no caso, 132 agentes envolvidos nas atrocidades.
As equipes da comissão ainda realizaram inspeções em 11 instalações
públicas, civis e militares reconhecidas por ex-presos políticos como locais
onde ocorriam detenções ilegal, torturas, execuções, desaparecimentos forçados
e ocultações de cadáver.
Também foram colhidas informações junto a órgãos públicos, como a
Advocacia-Geral da União, Polícia Federal, Ministério Público, comissões e
arquivos estaduais, além das Forças Armadas, que colaboraram com papéis
contendo informações sobre a trajetória individual de militares.
A feitura do relatório também contou com participação de civis, como
associações de familiares mortos ou desaparecidos, testemunhas que moravam
perto dos locais das violações. Foram realizadas perícias para esclarecer a
morte dos ex-presidentes João Goulart e Juscelino Kubitschek, além do educador
Anísio Teixeira.
Fonte Globo.com
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