Ao 24 anos, Patrícia Vieira* já superou mais obstáculos do que muitas
pessoas com o dobro de sua idade. Diagnosticada como soropositiva aos 2 anos,
perdeu a mãe e o pai para a aids ainda pequena. Aos 8 anos, chegou a tomar 24
comprimidos antirretrovirais por dia na tentativa de conter a doença. Hoje, a recepcionista
coleciona vitórias: “Consegui terminar o ensino médio, me casei, tive uma filha
que, assim como meu marido, não é soropositiva e estou me formando em
administração este ano”.
Patrícia nunca soube ao certo como o HIV chegou até sua família. O pai
descobriu ser soropositivo em 1992 e morreu 30 dias após o diagnóstico. A mãe
foi diagnosticada logo em seguida e morreu quatro anos depois. Criada pelos
avós paternos, ela lembra que o retrato de quem vive com HIV hoje é bem
diferente do de antigamente. Nos anos 90, a avó precisava manipular os
comprimidos para que virassem xarope, mas o procedimento era caro.
“À medida que o tratamento antirretroviral foi melhorando, foi ficando mais
fácil. Naquela época, minha avó esperava que nós duas, eu e minha irmã,
fôssemos as próximas a morrer. Passamos a viver um ano de cada vez e chegamos
até aqui”, contou.
Apesar de ter uma vida normal, Patrícia não pode abrir mão dos remédios.
Para outros jovens, ela recomenda que busquem informação de qualidade e
procurem se prevenir por meio do uso da camisinha. Ela também alerta para a
importância do teste rápido para detecção do HIV, uma vez que a doença não
escolhe suas vítimas.
Eduardo Santos*, 24 anos, não acreditava que pudesse estar entre os novos
casos de infecção por HIV no país. Em 2012, entretanto, recebeu o diagnóstico.
“A gente sempre pensa que pode confiar no parceiro, que nunca vai pegar. Fiz o
exame por acaso, porque tinha passado muito mal e o médico me pediu que
fizesse. Não suspeitava de jeito nenhum. A primeira sensação que tive foi de
medo. Achei que ia morrer”, lembra.
O jovem garante que fazia check-ups todos os anos e que praticava
sexo seguro. “Mas, quando você está namorando, a camisinha vai começando a
ficar de lado. Na década de 80, existia aquele medo da morte pela aids. As
pessoas se preocupavam mais. Hoje em dia, não. As pessoas estão mais
descuidadas. Agora sei que não dá pra abrir mão da camisinha.”
Dois anos após o diagnóstico, Eduardo ainda não voltou a namorar. A família
do rapaz também não sabe que ele é soropositivo. “Querendo ou não, você conta
pra um que conta pra outro e todos acabam sabendo. É uma questão delicada. E
eu, por ser homossexual, acham que foi promiscuidade, que transo com todo
mundo. E eu só transei com uma pessoa que tinha o vírus”.
Apesar da pouca idade, o estudante Bruno Rodrigues*, 20 anos, também tem
muita história pra contar. Diagnosticado como soropositivo aos 5 anos, perdeu o
contato com o pai pouco depois que a mãe descobriu ter sido infectada por ele.
“Não tem como falar sobre isso para uma criança. Até os 12 anos, eu só sabia
que a aids matava”, lembra. “Aos 16 anos, tive uma namorada e terminei o
relacionamento por causa do HIV. Não contei a ela. Afinal, ela não ia querer
namorar uma pessoa assim”.
Outro baque foi o alistamento para o Exército, barrado em razão do
diagnóstico de soropositivo. “Um sargento me chamou e me disse que não podia.
Fiquei chateado porque era um dos meus sonhos. Chorei muito. Tinha só 18 anos”.
Com a ajuda de um psicólogo, as ideias foram clareando. Hoje, Bruno namora, sai
com os amigos e vai se formar em farmácia no ano que vem.
“A impressão que tenho é que a maioria dos jovens não tem boca, não vai
atrás dos seus direitos”, disse. “Outro problema é que, como a doença perdeu um
pouco o foco, ocorreu um relaxamento. E não é só entre jovens que não têm HIV.
Entre os que têm também. Conheço muita gente que diz que fez sexo sem camisinha
e não contou pra pessoa. Não podemos baixar a guarda”, completou.
A orientação de Bruno é que os jovens com diagnóstico recente procurem
organizações não governamentais em seus estados e municípios, como a Rede
Nacional de Jovens Vivendo com HIV no Brasil. “Sei que o HIV fecha muitas
portas, mas as portas que se fecham é a gente mesmo que acaba trancando e dá
pra abrir de novo”, concluiu.
A diretora do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids) no
Brasil, Georgiana Braga-Orillard, reforçou a importância da prevenção à aids
entre os jovens por meio de campanhas que aprofundem o tema e que trabalhem a
discriminação. “As pessoas estão cada vez menos confortáveis em conversar sobre
a sua sexualidade e isso pode gerar grande consequências”.
*Nomes Fictícios
Fonte Agência Brasil
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