quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Preço do petróleo já caiu 27% desde junho e divide analistas quanto à tendência da cotação

Desde junho, os preços do petróleo do tipo Brent (referência internacional) apresentam uma tendência acentuada de queda, oscilando negativamente 27%, entre o pico de US$ 115,06 o barril, em 19 de junho, aos US$ 83,78, em 15 de outubro, menor patamar do período. Na terça-feira, a cotação do Brent deu um alívio e avançou 0,57% em relação à véspera, para US$ 85,89, mas permanece bem abaixo de sua posição em junho. Para analistas e operadores, há duas forças puxando os preços para baixo, uma econômica e a outra, geopolítica. Em ambas as explicações há igualmente uma boa dose de especulação.
No campo das finanças, há um crescente desânimo abatendo investidores e outros agentes econômicos, diante da percepção que a recuperação econômica das principais potências começa a perder fôlego, num momento em que as autoridades monetárias praticamente esgotaram seus arsenais de estímulos. Os principais bancos centrais, como o Federal Reserve (Fed, o BC americano), adotaram medidas não convencionais, como corte de juros a zero e a compra de ativos mensais — o chamado “quantitative easing” — para estimular a recuperação. E, apesar de tudo, a deflação continua uma ameaça concreta no horizonte.
Uma economia decadente significa queda de demanda por petróleo, à proporção que a atividade, em geral, diminui. E, apesar disso, o mercado não está vendo membros importantes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) reduzindo sua produção para se adequar à demanda menor. A razão disso, dizem os analistas, seria uma disputa por participação de mercado, o que estimularia estas nações a continuarem produzindo, apesar de os países importadores estarem com suas reservas cheias.
A esta percepção acrescentam-se os conflitos geopolíticos, como a refrega entre Rússia e Ucrânia, que levou os Estados Unidos e a União Europeia (UE) a adotarem sanções contra o governo de Putin, cujos efeitos negativos estão respingando na zona do euro. Os protestos por democracia nas ruas de Hong Kong colocam outro ator importante no front dos conflitos: a China. Motor dos emergentes na recuperação da economia global, com uma taxa de expansão anual média acima de 8%, o país já sinalizou que terá um crescimento mais modesto nos próximos anos (em média 5,5%) e menos ainda a longo prazo (3,9%). A perspectiva de sanções do Ocidente por causa de Hong Kong só piora o humor dos mercados.
Por fim, a chegada do vírus do Ebola a Dallas, por mais que seja improvável uma disseminação da doença no país, contribui para o desamparo geral.

ANALISTAS DIVIDIDOS
Os analistas estão divididos tanto sobre as razões da forte venda de papéis da commodity nos últimos quatro meses quanto se esta continuará seu caminho ladeira abaixo. Economistas do Goldman Sachs e do Morgan Stanley afirmaram que o ciclo de venda está exagerado e, portanto, perto do fim. Porém, outros especialistas dizem que novas quedas provavelmente vão ocorrer no futuro.
Nas últimas sessões, os preços se recuperaram um pouco, puxados por notícias como a interrupção da produção em um campo petrolífero conjunto de Arábia Saudita e Kuwait devido a preocupações ambientais. Além disso, um relatório saudita mostrou um declínio no maior exportador de petróleo do mundo. Por outro lado, o Irã recuou de uma reunião de emergência da Opep para discutir cortes de produção e defesa de preço, o que significa que qualquer alteração sobre o volume de produção só ocorrerá na reunião protocolar, marcada para 27 de novembro.
“A questão se resume a se já chegamos ao fundo; e eu não creio que tenhamos chegado lá”, disse ao jornal “Wall Street Journal” o analista Gene McGillian, da Tradition Energy. “É como se o mercado estivesse tentando se estabilizar, mas temores de uma atividade econômica em declínio e estoques elevados vão continuar puxando os preços para baixo.”

SHALE GAS
A queda dos preços do petróleo já está levando analistas a reavaliarem o valor do boom do gás não convencional americano, que promete uma revolução energética, que colocará os Estados Unidos como líder mundial no setor energético. E os mesmo vale para o pré-sal brasileiro. Segundo analistas, com um preço abaixo de US$ 80, um terço da produção americana de gás se tornaria economicamente inviável. Pela primeira vez, desde 2010, as petrolíferas acrescentariam menos barris à produção doméstica em relação aos anos anteriores, segundo as firmas Macquarie Group, ITG Investment Research e PKVerleger, ouvidas pela Bloomberg.
A perfuração horizontal de gás não convencional representa 55% da produção americana e a Agência Internacional de Energia previu que os Estados Unidos vão ultrapassar Rússia e Arábia Saudita para se tornar o maior produtor do mundo em 2015. Embora haja sinais de recuperação e estabilização, uma crescimento mais lento da produção americana abalaria as percepções em relação ao mercado global, avaliou Vikas Dwivedi, economista especializado em petróleo e gás da Macquire.

TEORIAS DA CONSPIRAÇÃO
A queda tão vertiginosa de preços do petróleo — 27% desde junho — gerou algumas teorias da conspiração, especialmente num mercado fortemente orientado por decisões políticas. A mais popular delas é a de que americanos e sauditas estão em conluio para abalar financeiramente as economias de seus inimigos — Rússia e Irã. Segundo essa lógica, em ambos os casos, uma queda de receita proveniente das exportações de petróleo poderia levar o presidente Vladimir Putin e o supremo líder iraniano, aiatolá Ali Khamenei, à mesa de negociações, para tratar de um acordo sobre a Ucrânia e as ambições nucleares do Irã.
Em artigo para o “Financial Times”, Nick Butler, especialista em energia, afirmou não descartar tal teoria, embora a considere improvável. O importante, escreveu ele, é “observa o que acontecerá a seguir. O risco para o setor petrolífero e para muitos países dependentes das receitas do petróleo é que os jogos da Arábia Saudita levou ao descontrole do mercado. Preços podem cair bem mais, com consequências imprevisíveis e negativas, a começar com maior instabilidade regional e um corte de investimento que só pode alimentar o próximo ciclo.”
O desafio agora, disse ele, é saber se os sauditas têm condições de inverter a queda de preços. O risco é que a tendência que se vê desde junho leve outros países a elevar suas produções a curto prazo para aumentar uma tão necessária receita. “Cada campo que pode produzir mais é pressionado a fazê-lo. Paradas de manutenção programadas são adiadas e assim por diante”, disse Butler. E esse é o ponto central: até agora, a queda vertiginosa dos últimos meses não provocou um corte na produção.


Fonte Globo.com

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